Das sete imagens sacras furtadas em 1996 quatro já foram recuperadas: São Benedito, São José, Santo Antônio e Nossa Senhora das Dores. Outras três seguem desaparecidas: Nossa Senhora da Soledade, São Joaquim e Santa Efigênia.

O dia 9 de maio de 2024 entrou para a história da comunidade de Lobo Leite, distrito de Congonhas, na Região Central de Minas Gerais. Depois de quase 30 anos a imagem de São Benedito, furtada em 1996 e recuperada há pouco mais de um mês pelo Ministério Público de Minas Gerais, retornou à Capela de Nossa Senhora da Soledade de onde havia sido retirada. Uma grande festa, com a participação de aproximadamente duzentas pessoas, foi realizada para receber a imagem do santo considerado padroeiro dos cozinheiros.

Estiveram presentes em Lobo Leite o promotor de Justiça Marcelo Maffra, que está à frente da Coordenadoria das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico de Minas Gerais (CPPC); o promotor de Justiça de Congonhas, Vinícius Alcântara Galvão, o prefeito de Congonhas, Cláudio Antônio de Souza; Paula Carolina Miranda Novais, servidora do MPMG, especialista em cultura e arte; representantes da Polícia Militar, Defesa Civil entre outros.Ao chegar em Lobo Leite a imagem de São Benedito foi escoltada por veículos da Polícia Militar, Guarda Civil e MPMG até chegar à Capela de Nossa Senhora da Soledade onde foi recebida pela comunidade e pal Banda Dança do Rosário, de Conselheiro Lafaiete.

Após a entrega da peça, uma imagem de madeira policromada do século XVIII, foi celebrada uma missa pelo padre Geraldo Barbosa, responsável pela Paróquia de Nossa Senhora Mãe da Igreja, a qual pertence a Capela de Nossa Senhora da Soledade.

Efigênia da Conceição Ferreira, de 84 anos, que desde os 3 anos mora em Lobo Leite, disse que o retorno de São Benedito “é uma vitória para a comunidade. Estamos muito agradecidos a todas as autoridades que ajudaram a trazer a imagem. Sentimos muito a falta de São Benedito e ainda sentimos pelos demais que ainda não voltaram, com as de Santa Efigênia e Nossa Senhora da Soledade”.
Ainda conforme Efigênia da Conceição, “agora é só felicidade e agradecimento, primeiro a Deus e depois a todos que nos ajudaram. Esse foi mais um milagre e esperamos que as outras imagens que não estão aqui possam voltar”.

De acordo com o promotor de Justiça Marcelo Maffra, “esse momento, que marca o retorno de São Benedito, é um dos mais importantes na minha carreira enquanto servidor público que atua na defesa do patrimônio cultural. Agradeço imensamente a essa força de acolhida que simboliza o retorno do São Benedito para a comunidade. Que a partir da divulgação desse caso, nós possamos receber mais informações sobre as outras peças que ainda estão desaparecidas. A sociedade e por isso cada um de vocês. A participação da sociedade é extremamente importante nesse processo permanente de vigilância do patrimônio cultural

Já o padre Geraldo Barbosa, disse que a comunidade vê o retorno do santo como um sinal de Deus. “Devemos ao Leandro, que infelizmente não pôde estar aqui hoje, quando identificou essa imagem no site de leilões e a partir daquele momento, a comunidade se mobilizou para acolher São Benedito. A imagem é muito venerada no Brasil.

É uma peça que resgata a cultura negra através dessa manifestação bonita do povo”, destaca.
Ainda conforme o pároco, “Benedito lembra esse descendente negro que abraçou com toda humildade a missão do ideal de Francisco de Assis. Eu creio que é o espelho que a comunidade procura viver com humildade, com serenidade, mas com garra também quando as coisas fogem do controle”.

Peças sacras furtadas em 1981 e 1996
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Segundo a CPPC, das sete imagens sacras furtadas em 1996 quatro já foram recuperadas: São Benedito, São José, Santo Antônio e Nossa Senhora das Dores. Outras três seguem desaparecidas: Nossa Senhora da Soledade, São Joaquim e Santa Efigênia.

Há outro registro de furto ocorrido em 1981 na Capela de Nossa Senhora da Soledade, construída na primeira metade do século XVIII e tombada em 1978. Na ocasião foram subtraídas coroas de prata, cálice, âmbula e algumas imagens sacras, entre elas as de Nossa Senhora da Conceição e São Sebastião Pequeno.
Essas duas peças estão catalogas no “Sondar”. Lançada em 2021, a plataforma reúne objetos mineiros desaparecidos, recuperados e restituídos e pode ser acessada pela internet, por meio de computador, tablet ou celular. Ela disponibiliza um acervo de cerca de 2.500 bens culturais mineiros, como documentos e peças de arte sacra. Desde que foi lançado o sistema já ajudou a identificar ou recuperar mais de 700 bens.
Imagem seria leiloada
Em abril deste ano a Coordenadoria de Patrimônio Cultural recebeu uma denúncia via “Sondar” informando que uma imagem de culto coletivo estava sendo anunciada em site de leilões. Foi encaminhado pelo denunciante o link do leilão. A peça seria leiloada em Belo Horizonte no dia 17 de abril.

No dia 12 de abril o setor técnico da Coordenadoria elaborou parecer sobre a denúncia. Embora estivesse sendo ofertada como “Santo Elesbão”, confirmou-se tratar-se de uma imagem de São Benedito. Em consulta ao “Sondar” verificou-se que a peça estava cadastrada no Sistema como desaparecida. Também constava nas fichas de bens desaparecidos do Instituo Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha).

A análise dos registros evidenciou a correspondência das características visuais e formais, assim como as proporções da peça objeto de denúncia e a que foi furtada do município de Congonhas.

Diante dos fatos, o MPMG sugeriu que a imagem fosse imediatamente retirada do leilão e o comerciante apresentasse informações sobre a peça. O Ministério Público solicitou ainda que fosse viabilizado o acesso físico à peça, para fins de realização de trabalhos/estudos periciais.

Ainda no dia 12 o comerciante recebeu notificação para retirada da peça do leilão. Três dias depois a imagem foi entregue na sede da Coordenadoria. No dia seguinte moradores de Lobo Leite estiveram em Belo Horizonte e fizeram o reconhecimento do bem.
Após a comprovação definitiva de que a escultura pertence ao município de Congonhas foi determinado que ela retornasse ao seu local de origem e procedência.

Fotos: Camila Soares e Alex Lanza/MPMG