A partir da chegada, em 1808, da corte portuguesa ao Rio de Janeiro, o Brasil teve seu território aberto à visita de naturalistas das mais diversas nacionalidades, que para cá se deslocavam em busca de descobertas sobre um território desconhecido e promissor, tanto sob o ponto científico quanto econômico. John Mawe, Richard Burton, Spix, Martius, Charles Bunbury, R. Walsh, Johann Pohl e Langsdorff foram alguns dos viajantes que percorreram o território brasileiro durante o século 19, mas nenhum deles deixou marca mais acentuada de sua passagem pelo país quanto o francês Auguste de Saint-Hilaire.

Auguste François César Prouvansal de Saint-Hilaire nasceu em Orleans, na França, em 4 de outubro de 1779, filho de Augustin François Prouvansal de Saint-Hilaire (1745-1835) e de Anne Antoinette Jogues de Guédreville et Poinvillé (1755-1842).
Oriundo de família nobre, fez seus primeiros estudos no Colégio Real Militar de Pontlevez, dirigido pelos beneditinos. Depois da Revolução Francesa, foi enviado para a casa de um tio na Holanda, onde estudou comércio. Voltou à terra natal em 1802, dirigindo-se para Paris, passando a estudar botânica no Museu de Ciências Naturais com Antoine Laurent Jussieu e René-Louis Desfontaines.

A convite do duque de Luxemburgo, então embaixador extraordinário da França junto à corte portuguesa, partiu do porto de Brest para o Brasil em companhia do diplomata seu protetor, em 1º de abril de 1816, a bordo da fragata Hermonione.

Desembarcou no Rio de Janeiro em 1º de junho. Logo em seguida iniciou as viagens pelas províncias do Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo, Goiás, Espírito Santo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, além do território da Cisplatina (Paraguai e Argentina). Percorreu cerca de 2,5 mil léguas (aproximadamente, 12,5 mil quilômetros), formando um herbário de 30 mil espécimes de mais de 7 mil espécies, das quais cerca de 4,5 mil eram desconhecidas dos cientistas à época.

Saint-Hilaire encaminhou à Europa amostras de minérios, 129 espécimes de mamíferos (48 espécies), 2.005 aves (451 espécies), 35 espécimes de répteis (21 espécies), 58 peixes (21 espécies), algumas conchas e cerca de 16 mil insetos, dos quais 800 ainda não eram conhecidos.

Minas Gerais foi a província mais explorada cientificamente por Saint-Hilaire, que a cortou de norte a sul e de leste a oeste. No Sul, Zona da Mata e Campo das Vertentes, por exemplo, deixou registros sobre as localidades de Rio Preto, Andrelândia, Ibitipoca, Aiuruoca, Baependi, São João del-Rei e Barbacena. Na Região Central, Congonhas, Ouro Branco, Ouro Preto, Mariana, Sabará, Caeté, Santa Bárbara, Itabira, Morro do Pilar e Conceição do Mato Dentro foram visitadas. No Rio Doce, Guanhães, São João Evangelista e Peçanha acolheram o viajante. No Vale do Jequitinhonha, passou por Rio Vermelho, Itamarandiba, Serro, Diamantina, Minas Novas, Araçuaí, Jequitinhonha e Almenara. No Oeste, Alto Paranaíba e Triângulo, esteve em Formiga, São Roque de Minas, Coromandel, Araxá, Patrocínio e Paracatu. No Norte, Saint-Hilaire percorreu as veredas às margens do São Francisco, passou por Montes Claros e chegou a Januária.

 

Roteiro percorrido por Saint-Hilaire ( Ilustração: atribuição CC BY ) Mapa: Coordenadoria das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico

 

Crônica -Drummond

ANDRADE, Carlos Drummond de. Meu amigo Saint-Hilaire. Jornal do Brasil, 16 de outubro de 1979, Caderno B, p. 5.

DIÁRIO
Saint-Hilaire registrou em seu diário, de maneira minuciosa, os mais diversos aspectos da sociedade com a qual travou conhecimento e do território que percorreu, legando-nos informações de extrema relevância nas áreas de botânica, medicina, história, geologia, arqueologia, paleontologia, geografia, etnologia e antropologia, entre outras ciências.

Sobre Minas, os modos de vestir, as comidas, o uso das plantas medicinais, as superstições, a burocracia da máquina administrativa, a forma predatória de desenvolvimento da agricultura, as marcas da destruição deixadas pelas antigas extrações de ouro, as águas minerais, o modo dos tropeiros, os costumes indígenas, o tratamento dado aos escravos, o comportamento do clero e o consumo da cachaça foram alguns dos aspectos que não passaram ao largo do olhar perspicaz do naturalista.

O alargado e profundo convívio com o povo mineiro fez surgir em Saint-Hilaire uma afeição singular à gente das Alterosas, a qual sempre reputou como a mais cordial e hospitaleira do país. Chegou a escrever que, como “passara 15 meses na parte mais civilizada da província de Minas Gerais, acolhido com tanta benevolência, me identificara com os interesses dos seus habitantes” e se encontrava “quase na posição em que estaria um mineiro que, após ter estudado o seu país, quisesse conhecer também outras partes do Brasil”. Findos os trabalhos de campo, depois de preparar o vasto material colhido, o viajante retornou à Europa nos primeiros dias de agosto de 1822. Já no ano seguinte, defendeu sua tese de doutorado na Faculdade de Ciências de Paris, abordando suas viagens ao interior do Brasil.

RELATO
A partir de 1825, Saint-Hilaire passa a publicar o resultado de suas observações botânicas no Brasil e o relato de suas viagens. Em 1834, foi nomeado professor adjunto de botânica da Faculdade de Ciências da Sorbonne.
Com quase 74 anos, Auguste de Saint-Hilaire faleceu de apoplexia em 30 de setembro de 1853, no Castelo de la Turpiniére, em Sennely (Loiret), sendo sepultado no grande cemitério de Orleans.
Os anos, as décadas e os séculos se passaram. Mas a figura de Saint-Hilaire não se desvinculou da história de Minas Gerais e do Brasil.

Em 1979, o grande poeta Carlos Drummond de Andrade registrou em crônica (leia aqui)  homenagem ao bicentenário de nascimento do naturalista: “É um caso de simpatia pessoal e também de gratidão. Entre os viajantes estrangeiros do começo do século 19, ele me interessou mais do que qualquer outro, pelo que viu e contou de Minas. E não só de Minas: do Espírito Santo, de Goiás, de São Paulo, do Sul do Brasil. Graças a ele viajei por essas terras, conheci seus moradores, seus costumes, plantas, animais e minerais sem precisão de sair de casa.”

Em recente seminário nacional sobre plantas medicinais realizado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em Belo Horizonte, foi celebrado o bicentenário da chegada ao Brasil do cientista francês. Merecida homenagem ao mais brasileiro dos estrangeiros que estiveram entre nós no século 19.

ANOTAÇÕES DO VIAJANTE

Vila do Fanado. Chapada Sucuriú*
Em Viagem às províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais (Editora Itatiaia) “Enquanto estava em Sucuriu, diversas pessoas trouxeram-me várias plantasusuais, recebi-as, principalmente, de um bom ancião que conhecia grande número delas. Como não existem nessa localidade nem médicos nem cirurgiões, os habitantes para se curarem experimentaram os vegetais que tinham à disposição, e não existe colono que não possua ao alcance seus medicamentos.

Algumas plantas medicinais foram indicadas aos portugueses pelos índios, que, sem dúvida, as conheciam havia muito tempo; a semelhança mais ou menos impressionante com as espécies usadas na Europa, o gosto, o odor peculiar, e, muitas vezes, talvez, só a fantasia, decidiram da escolha de outras plantas usuais.

Os nomes vulgares das espécies empregadas como remédios podem, aliás, servir em grande parte para desvendar a história da descoberta de suas propriedades reais ou imaginárias.

Assim, os nomes guaranis, caapiá (Dorstenia), ipecacuanha (Cephaelis ipecacuanha), sambaíba (Curatella sambaiba), etc., designam suficientemente espécies cujo conhecimento é devido a indígenas; os nomes de barbasco e centaurea maior ou menor foram aplicados pelos portugueses a uma ou várias espécies de Buddleja e Chirontas, que lhes lembravam o verbasco ou a centaurea de sua pátria; finalmente, os nomes de padre-salema (Gomphrena officinallis), quina-de-remijo (Cinchona remijana, Aug. de S. Hil.), ana-pinta (uma cucurbitácea) são evidentemente os das pessoas que foram as primeiras a empregar esses vegetais como remédios.

Seja como for, sente-se que a matéria médica dos brasileiros, baseada unicamente no empirismo, deve ser muito imperfeita. Todavia, entre tantas plantas às quais se atribuem falsamente propriedades maravilhosas, algumas existem que realmente fornecem remédios eficacíssimos. Se existisse no Brasil maior número de homens instruídos, o governo desse país faria obra de grande utilidade nomeando em cada província uma comissão que se encarregasse de submeter a exame minucioso todas as plantas de que se utilizam os colonos para aliviar seus males. Por esse meio, poder-se-ia chegar a constituir, para os vegetais, uma matéria médica brasileira que elucidaria os colonos a respeito de remédios ineficazes ou perigosos, e, ao mesmo tempo, daria a conhecer aos nacionais e estrangeiros grande número de plantas benéficas.”
*Francisco Badaró, cidade no Vale do Jequitinhonha

QUADRO GERAL DO SERTÃO
Em Viagem às províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais (Editora Itatiaia) “Muito frequentemente os currais estão situados a certa distância das fazendas. Na época em que as vacas e éguas têm crias, os vaqueiros vão estabelecer-se próximo a esses recintos, em uma cabana a que chamam retiro, e que pode ser comparada aos chalets da Suíça e aos burons do Auvergne. Na maioria das vezes, os vaqueiros não levam consigo nenhuma provisão; vivem de leite cru, de coalhada misturada com mel e de várias espécies de frutos selvagens, que se sucedem quase durante toda a estação da cria dos bezerros e potros.

Esses frutos são várias espécies de araticu (Anona), a guabiroba (Psidium), várias espécies de araçá (Psidium), a jabuticaba (fruto que se prende ao tronco de uma Mirtácea), várias espécies de murici (Malpighiacea), o giqui, o humbu (Spondias tuberosa), o genipapo (Genipa americana, I.), o burity (palmeira Mauritia vinífera, Mart.), a mangaba (Apocynacea, Hancornia speciosa, Gom.), duas espécies de goiaba, diversas variedades de bacopari (Sapotacea), a guabiroba (palmeira Cocus oleracea, Mart.), a pitomba (Sapindus esculentus, St. Hil. Jus. Camb.), a mutamba (Guazuma ulmifolia, Aug. de Saint-Hil.), a marmelada, o indaiá (palmeira), a cagaiteira (Myrtus desinterica, Mart.), várias espécies de ingás (leguminosas), o jabotá (leguminosa), o borulé, urticácea.”

 

Marcos Paulo de Souza Miranda
Promotor de Justiça, integrante do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais e da Academia de Letras do Ministério Público do Estado de Minas Gerais

Publicado no Jornal Estado de Minas, 21 de outubro de 2016 – Caderno Cultura,  p. 2

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